Ou "Delírio". Ou "Demência". Ou "Psicotrópicos".
Dex olhou para baixo e a vertigem fê-lo vacilar. Um relâmpago iluminou o céu nocturno, ao longe, e o ribombar do trovão chegou pouco depois, abafado pelo estrépito contínuo da chuva torrencial. Olhou para baixo e viu o vazio a abrir-se diante dele, o nada a chamá-lo para a consolação do infinito. E lá ao fundo, muito em baixo, apenas um prado de luzes cintilantes, bruxuleando de forma surreal.
Abriu os braços e deu mais um passo em direcção à berma. Outro relâmpago estalou sem aviso, muito mais perto que o anterior e o estrondo fez com que desse um salto que quase o atirou para o oblívio. Mas recompôs-se e riu alto, loucamente, despropositadamente. Riu-se e gritou e desafiou a tempestade a lavá-lo daquela dormência que o assolava, que estava impregnada na sua vida e na de toda a gente. E quando o vento lhe respondeu com brutalidade, chicoteando-o sem piedade e vergando perigosamente a estrutura de metal onde ele estava apoiado, Dex quase vomitou as tripas, mas riu-se perdidamente, extasiado com a evidência de estar vivo.
Ergueu o olhar para abarcar a cidade que o rodeava a perder de vista, as formas cinzentas dos edifícios esbatendo-se contra o fundo negro da noite e as luzes, centenas, milhares de luzes, cintilando a seus pés e até ao horizonte distante.
Na sua indiferença e eterna frieza, a metrópole era lavada de uma sujidade inextinguível, purificada pelas vergastadas da chuva implacável e assim animada duma beleza intangível, odorífera, que o envolvia numa embriaguez eufórica, da qual não se queria libertar. Um terceiro relâmpago rasgou o céu e as fachadas iluminaram-se de cores de prata, os prédios escarpados projectando sombras negras nas ruas e nos becos escondidos. As gotas reluzentes da chuva pareceram parar no ar durante um instante dilatado em que o clarão iluminou tudo e Dex susteve a respiração, tentando congelar aquele momento na eternidade. Mas então o clarão desapareceu e os alicerces do mundo tremeram perante a formidável explosão sonora da trovoada. Dex não conseguiu suportar a ideia de deixar escapar a magia daquela tempestade e sentiu uma urgência enorme de se juntar a ela. Sem pensar, flectiu as pernas e atirou-se de cabeça para o abismo, gritando de alegria.
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