Sobre este blog

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segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Os de Ontem

A constatação da irreversibilidade da vida não é propriamente um "breakthrough". Na verdade não tem nada de original. É uma ideia velha, um lugar-comum, algo que afecta toda a gente nalguma altura e o problema de ser tão universal é que acaba por ser vista com grande banalidade. Mas houve um dia em que esta constatação surgiu-me quase como uma epifania e a sensação que me transmitiu foi tão forte que quis cristalizá-la. Desse esforço nasceu este texto, não mais do que uma sombra daquilo que verdadeiramente quis exprimir.


Pesa as minhas palavras.

Se te parecem cliché tenta esquecer que o são, porque de facto o são, e tenta lê-las como se nunca tivesses pensado nelas, limpa-te de ideias pré-concebidas, para que possas voltar a assimilar o seu verdadeiro significado.

Não há nada neste mundo que pese mais que a passagem do tempo.

Os amigos e amores de hoje parecem ser a coisa mais importante que tens e alguma vez tiveste.

Tal como pareciam os de ontem.

Mas as voltas da vida levaram-te para longe deles.

Primeiro deixaste de passar o teu tempo com eles.

Depois deixaste de os contactar.

Deixaste de lhes falar.

Deixaste de os ver.

Deixaste de os lembrar.

E nada disto te incomoda, porque não te lembras.

E não magoa, porque é uma transição tão gradual, tão recíproca, que nem te apercebes.

E esqueces.

Aquilo que era tudo.

Aquilo que te preenchia.

Aquilo que amavas. E que te amava.

Esqueces.

Não te irá pesar enquanto não passar muito tempo.

Anos.

Passam anos.

Cresces.

Mudas.

Até que fortuitamente eles voltam a impregnar a tua vida transportados através de uma história vinda de longe, de uma fotografia esquecida, de um sonho, de uma memória antiga.

E aí o peso do tempo afunda-se em ti.

Olhas para o dia solarengo, para o chilreio dos pássaros, para o sorriso das crianças, para o céu limpo e azul e tudo o que vês é uma tristeza atónita, colossal, um assombro de decrepitude, uma saudade inconcretizável, o esmagamento por uma solidão maior que a vida.

Como pudeste esquecer-te, perguntas-te.

A nostalgia preenche-te de uma dormência constritiva, de uma vertigem de lucidez que é a angústia da existência.

A angústia de saberes que nada do que fazes faz sentido.

Nada do que tens.

Nada do que amas.

Nada do que julgas certo ou errado.

A tua vida não tem significado ou propósito.

As pessoas que eram as mais importantes não fazem agora parte da tua vida e tu nem te apercebeste de como isso aconteceu.

Agora, há outras que as substituem. Outras com quem podes contar. Outras com quem convives, ris e confidencias. Outras que amas e que te amam.

Contudo, a lembrança dos de ontem, que ainda te percorre, faz-te perceber que o que sentes por todas elas e o que elas sentem por ti é completamente artificial. Amigos e amor são algo que precisas para te sentir completo e feliz, no entanto, as pessoas em que concretizas a tua amizade e o teu amor, essas, são inextrincavelmente aleatórias. Tu usa-las como invólucro para esses sentimentos do mesmo modo que elas te usam a ti.

Aquilo de que precisas verdadeiramente não é delas, mas dos sentimentos que elas te despertam. E és viciado neles. Não consegues de todo viver sem eles.

Quando as pessoas onde os guardaste morrem, ou quando és separado delas pelas circunstâncias, pensas ter perdido tudo o que tinhas. Mas o tempo ensina-te que apenas perdeste recipientes, o conteúdo nunca te abandonou. Só precisas de novos recipientes para encher com o mesmo conteúdo.

Porque tu não amas aqueles que amas, o que amas é o amor que sentes.

És uma criatura ridícula, profundamente ignorante, que vai morrer inevitavelmente. Contudo o que é mais ridículo em ti é não seres capaz de viver sem outros como tu, outros a que tens de agradar para que te agradem a ti.

Toda a tua vida se regula em função deles.

É por eles que te esmeras.

É por eles que te aperfeiçoas.

É por eles que te esforças.

É pela sua aceitação. Pela sua aprovação.

Mas no fundo não é por eles. É por aquilo que precisas que eles te dêem.

Tudo porque não consegues libertar-te desses sentimentos que nem sabes explicar.

E hoje lembraste-te dos de ontem e com eles esqueceste-te dos de hoje, porque o amor que mais te sacia é o amor novo, que vem acompanhado de paixão. Amas os de hoje, mas não lhes sentes paixão, porque já não são novos.

Os de ontem, por seu lado, estavam esquecidos, e ressurgidos desta forma aparecem-te como novos.

A tristeza amorfiza e no seu lugar começa a surgir um inconformismo obstinado, uma necessidade de recuperar o para sempre perdido, de remendar o irreparável, de ignorar o irreversível.

Procuras loucamente pelo seu paradeiro entre amigos de amigos, amigos de conhecidos, conhecidos de amigos. Move-te um sentimento que te transcende, enches-te de um rejúbilo que é a perspectiva de reviveres todos aqueles momentos maravilhosos que entretanto renasceram na tua memória.

Momentos que, ironicamente, não valorizaste de todo quando os viveste, tal como não valorizas os que vives agora mas que hás-de saudar um dia da mesma exacta forma.

Por fim encontra-los.

Os de ontem.

Os que eram tudo para ti.

Os que esqueceste.

E em vez da felicidade que esperavas alcançar ao tê-los de novo contigo, o que encontras é uma ainda mais amarga desolação que é a definitiva evidência de que aquilo que tanto saudavas não eram eles, mas sim memórias de momentos para sempre enclausurados no contínuo fluir do tempo, momentos que nunca poderás recuperar. Momentos em que eles te deram a amizade e o amor dos quais precisas tanto como do ar que respiras.

Olha-los nos olhos sondando-lhes a alma, incrédulo. Sentes que algures lá dentro tem ainda de estar uma chama, um resquício daquilo que partilharam, que sabes que era especial.

Em desespero, tentas reavivar essa chama, porque não consegues ver o que mudou. Tu queres que tudo volte a ser como era e vês nos olhos deles que eles também querem, mas então se assim é, porque é que já não é a mesma coisa?

Olha-los e vês os sinais que o tempo lhes deixou. Estão diferentes. Podem ser jovens, mas estão mais velhos. Quando olhas com mais atenção começas a ver.

Eles mudaram.

Ao assimilar esta conclusão reparas que o seu olhar reflecte-se no teu, como num espelho.

E percebes tudo com um sorriso profundamente angustiado.

Tu mudaste.

13 Comments:

Marco Robalo said...

A leitura do teu texto consegue provocar-me a mesma sensação de epifania.

Sonat said...

lol então não fui muito mal sucedido, obrigado!

Hugo said...

Eu vinha preparado para dizer merda e parvejar feito estupido, lancando piadas de merda sempre que visse uma oportunidade. Mas ao contrario do Marco, que conseguiu esgotar por competo a minha (fraca) criativiade, tu nao me forneces nenhuma ocasiao para isso. Os teus textos estão muito bem escritos, ainda mais tendo em conta a idade com que escreveste alguns deles. Salvo o facto de, em última análise, constituirem a forma suprema de anhanco (ou seja, com o maior rácio trabalho/utilidade) sao excelentes. A coisa mais verdadeira que disseste foi "anhoco nas horas vagas" (que sao muitas ainda). Acho que devias escrever um livro. Sei que os blogs servem para postar pensamentos, mas tambem gostava de ver o teu estilo de escrita a narrar.

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Há-de haver um cagalhao rijo na sanita do Marco antes do Sonat escrever um texto narrativo com principio, meio e fim.

Marco Robalo said...

Já postavas mais alguma coisa

Bjokas

Marco Robalo said...

Já postavas mais alguma coisa, meu filha da puta

Sonat said...

fdx, na ponhas pressão, eu vivo no mundo real não é aqui

Marco Robalo said...

fodasse...preciso de ouvir histórias vossas caralho...posta merdas nem que seja a contar histórias do hugo a cagar de porta aberta.

Marco Robalo said...

Posta qualquer coisa fodasse

Hugo said...

Fodasse Sonat do caralho nunca mais postas nada cabrao.

Sonat said...

boy só te digo isto: o teu quarto tá cagado numa proporção inimaginável, nunca o vi tão cagado. E o problema é que o teu quarto vai ser o meu quarto...

Hugo said...

lol eu no teu lugar não dizia isso com muita convicção, ainda fico por cá... :P

Hugo said...

Agora a sério, posta qualquer coisa. bjs.

Anônimo said...

Good words.